sexta-feira, 26 de março de 2010

Fincando Raízes

Nenhum filho de árabes pode dizer que nunca ouviu seus pais ou avós dizendo "ah, eu quero que você se case "bem", com uma moça (ou moço) "da colônia[árabe]", com alguém que tenha a mesma cultura..." e buscando todos os argumentos para fazer com que a próxima geração continue fazendo e pensando do mesmo jeito. É como se o fato de casarmos entre nós, os "filhos da colônia" de alguma forma servisse de barreira à dissipação da cultura de origem. Ao meu ver, é um pensamento até compreensível, porém ultrapassado e de pouca maturidade emocional. É um preconceito, uma segregação. Imigração É mudança! Eles, os imigrantes originais, talvez não tenham percebido, mas mudaram muito pelo fato de estarem imersos em uma cultura estrangeira. Não são os mesmos, nunca serão totalmente brasileiros, mas também não são mais o que seríam se tivessem ficado. Mudança é inevitável, aculturação é inevitável, é algo que irriga o ser completamente, não há escafandro que resolva. Minhas raízes davam sinais de terem se adaptado a esta terra e às pessoas daqui muito antes do meu casamento. Sempre me considerei, causando certa tristeza no meu pai, um Brasileiro filho de Sírios, embebido sim da cultura síria, mas essencialmente um brasileiro, com amigos e amores brasileiros. Compreensivelmente, após a morte do meu pai, alguns aspectos sírios se evidenciaram, como se eu pudesse assim manter vivo meu pai em mim. E meu pai morreu Sírio residente no Brasil, nunca pensou em se naturalizar, diferentemente do restante da minha família imigrada. Curiosamente, foi quem mais facilmente aceitou o fato de eu namorar e casar com uma moça brasileira, mestiça de todas as raças que povoaram este país, a minha esposa, companheira, amiga e eterna namorada Rejane, que me deu uma filha maravilhosa, também amiga, linda, doce e divertida, a minha querida e amada Júlia. Esse post era para ter sido publicado ontem, 25/3, dia do aniversário da Júlia, símbolo para mim das minhas raízes árabes, muito bem adaptadas à flora e à fauna deste nosso país. Eu sou grato por ter essas duas mulheres maravilhosas na minha vida, e este post é uma homenagem a esse dia emocionante da minha vida, quando Rejane trouxe Júlia ao mundo, e ao meu mundo.

Um comentário:

Babel Hajjar disse...

Comentário de ikhlas hardan, via buzz - fazem 40 anos que nao escrevo em portugues.nao sei se vou poder expressar o meu ponto de vista,pois penso em arabe,mesmo assim vou tentar.
o meu pai,como voce sabe, era tao patriotico quanto o seu,e viveu 50 anos no Brasil sonhando em voltar a sua terra natal.voltou e viveu aqui 10 anos muito felizes e cheios de empeendimentos(conseguiu impremir e lancar 10 livros com muito sucesso) mas nos ultimos dias de vida estava morrendo de saudade da vidinha dele no Brasil e so falava de voltar ai(a saude dele ja nao permitia,diabete e amputacao das pernas).
voce tem razao em tudo que escreveu, mas gostaria de saber que geracao vai esquecer das suas raizes pois descobri quando estive em visita ai ultimamente que muitos brasileiros de quarta e quinta geracao estavam procurando as suas raizes em busca de outra entidade ou e um outro assunto?
parabens pelo aniversario da Julia (adorei ver as fotos) e que essa harmonia e paz que voce sente junto as tuas mulheres permaneca pra sempre.27 mar
Resposta: Oi, Ikhlass, obrigado por seu comentário.
Não acho que se percam as raízes tão facilmente, mas conheço netos e bisnetos de italianos que da raíz só conseguiu a cidadania... desde a minha primeira ida à Síria que senti a dificuldade de poder cumprir o desejo do meu pai, que era na época de um dia voltar.A língua é um grande problema, pois acho que necessito de muitos anos de árabe para me expressar com alguma qualidade, e nunca tão bem como faço em português. O ponto central do meu texto foi o preconceito que muitos árabes da colônia, assim como acontece com gregos, chineses, coreanos, etc., com a "miscigenação", que traz a ideia de algo puro que se dilui. Encontrei e ainda encontro algumas dificuldades ligadas a isso e a outros preconceitos. Não quero que tenha a impressão errada, eu sou o árabe da minha turma de amigos brasileiros, o que apresentou chanclich e ensina a fazer baba ghanouj, adoro ler livros sobre sumérios, babilônios e assírios, saio em passeata, explico a quem posso as atrocidades cometidas por Israel, mas meu contato com a colônia diminuiu muito após a morte do meu pai, pois saí do meio em que ele circulava, e não pertenço ao meio que minha mãe circula. Abraço a todos!